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GONZAGA – DE PAI PARA FILHO –à sombra do juazeiro

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Tendo uma árvore nordestina como símbolo de uma história de amor, perda, mágoas e perdão, Gonzaga – de Pai Para Filho, ao som das canções do Rei do Baião, conquista e emociona com sua mágica comunicabilidade sobre os conflitos entre pai e filho

Adélio Costa e Júlio Andrade e o pé de juazeiro em GONZAGA – DE PAI PARA FIHO (2012), de Breno Silveira

Juazeiro, juazeiro, me arresponda por favor, juazeiro velho amigo, onde anda o meu amor, ai Juazeiro, ela nunca mais voltou…. O juazeiro, elegante e frondosa árvore que chega a 15 metros de altura, característica da caatinga nordestina, de ramos tortuosos protegidos por espinhos e reputada por seus dons medicinais, ganha importância como elemento dramático de Gonzaga – de Pai Para Filho, o novo trabalho de Breno Silveira. A árvore não apenas simboliza e expressa, mas perpetua a dor da perda do primeiro amor da vida dele, Nazinha. Os nomes deles estão gravados lá, foi ela mesma que escreveu, revela a canção escritra em 1949.

Comunicabilidade e emoção, características do cineasta brasiliense de 48 anos, norteiam a narrativa pausada,que faz questão de situar a temporalidade dos acontecimentos, centrados na figura de Luiz Gonzaga do Nascimento, segundo dos nove filhos de seu Januário de Exu, interior pernambucano. Chamado de mestre Lua, o saudoso Luiz é nacionalmente conhecido como O Rei do Baião.

Há grandes virtudes em Gonzaga – de Pai Para Filho e estão espalhadas ao longo de sua narrativa. Uma delas, quase imperceptível, é expor uma particularidade social nordestina do passado, o coronelismo. O impensado enfrentamento, pelo jovem e apaixonado Gonzaga, ao coronel Raimundo Diolindo, pai de Nazinha, expõe o poder dos criadores dos votos nulos e brancos no País. Um pequeno registro político contido na obra.

Landa Vieira como o jovem Gonzagão no Exército

A fuga de Gonzaga para o interior do exército torna-se instrumento de mudança de sua personalidade, moldando-o em um homem irascível, bruto e de pavio curto em contraste com a enorme sensibilidade para tratar da realidade nordestina através de suas canções de tristezas, alegrias e injustiças vividas pelo povo do sertão.

A jornada existencial de Luiz Gonzaga, o Gongazão, como os nordestinos o tratam, ainda que saudoso, está contada aos pedaços no filme de Breno. Há ausência de diversos personagens, como alguns de seus parceiros (especialmente o gaúcho Pedro Raimundo e o cearense Humberto Teixeira), de seus irmãos, também músicos, e de sua relação mais próxima com o povo (o filme a externa apenas através dos “shows”), além de acontecimentos marcantes de sua vida.

Mas, como se sabe, o cinema é síntese, e, bem executada, o ganho se torna notável para a obra. Entendo Gonzaga – de Pai Para Filho, como a busca da síntese. E ela se estabelece condensando a história de Gonzagão dentro de um tema, o qual intitulo como “o amor ausente gerou o amor onipresente”.

Breno Silveira, diretor de GONZAGA – DE PAI PARA FILOHO

Compreendo que o roteiro de Patrícia Andrade (livremente baseado em Gonzaguinha e Gonzagão: uma história brasileira, de Regina Echeverria, editado pela Ediouro em 2006) tenha procurado focar a história de Gonzagão e Gonzaguinha em suas propriedades dramáticas, a do homem que encravou em si a dor de duas perdas amorosas e que, pela bruteza com o qual destino o marcou, foi incapaz de externar o amor contido em si – não apenas em relação ao filho mais famoso, mas igualmente a todos os que formavam o seu círculo familiar.

Assim, Gonzaga – de Pai Para Filho é uma história de amor e seus elementos intrínsecos e dramáticos de perda, mágoas e perdão – a qual, certamente, será bem mais ampliada na minissérie que vem aí em 2013. E, não deixo de ver como notável a forma como Patrícia Andrade e Breno Silveira simbolizaram, em uma árvore, o juazeiro, o elemento dramático que perpassa toda a dor que acompanhou a existência Luiz Gonzaga em sua convivência com a dor da perda.

Gonzagão nunca foi bom em externar o seu sentimento de amor que tinha pelo sertão e suas coisas, também, da mesma forma, para com as pessoas. Seu estilo turrão e agressivo sempre foi um problema. Gonzaguinha, por sua vez, parecia conter em si a dor do mundo, tanto que chegou a ser apelidado de o “cantor rancor”.

Esse confronto de sentimentos, o de abandono de um e perda do outro, está sintetizado na sequência em que Gonzaguinha entoa Comportamento Geral (composta em 1973 e que deixou perplexos e escandalizados os jurados do Programa Flávio Cavalcanti, onde ele a cantou pela primeira vez – e que em seguida o levou a dar explicações ao DOPS) e Gonzagão sobe ao seu quarto, o recrimina por criar “músicas comunistas” e quebra o seu violão a la Sérgio Ricardo. Um conflito não apenas entre pai e filho, mas de personalidades, de gerações, formações culturais, posicionamentos políticos… e musical.

Adélio Costa e Júlio Andrade, Gonzagão e Gonzaguinha

Gonzagão e Gonzaguinha foram assim até que o amadurecimento mútuo os fez se reencontrarem, ajustarem os caminhos, forçados quando o filho, ao contrair tuberculose em 1975, passou 8 meses acamado e teve tempo suficiente para promover uma grande reflexão sobre a sua vida e a relação com o pai. Ambos reconheceram no outro uma extensão de si. Gonzagão nunca aceitou não ser o pai de Gonzaguinha. O sua onipresença estava “compensada” pelo dinheiro sempre presente nas mãos dos padrinhos cariocas – o que, obviamente, para o filho, não valia de nada. A ausência paterna, a grande dor do garoto criado e educado pelos padrinhos e que o acompanhou até então, acabou, finalmente, superada. E nessa superação das mágoas e na aceitação do perdão mútuo, Gonzagão também aprendeu e “relaxou” a guarda, em muito, com Gonzaguinha. Para o outrora “cantor rancor”, foi a vez de aprender a estar aonde o povo está. O aprendizado no perdão.

Diferentemente de 2 Filhos de Francisco, citado como um sucesso de 5 milhões de espectadores por ser “um filme alegre”, Gonzaga – de Pai Para Filho não me parece um filme muito “alegre”. Nem as músicas de ambos, geralmente, as são. Mas, Breno e Patrícia souberam se utilizar da aproximação, tolerância e convivência com as quais pai e filho fecharam a parceria em seus últimos anos de vida e concluir o filme – e não poderia ser de outra forma -, mas, mesmo assim, perdura, após os créditos finais, um certo sentimento de tristeza. Talvez, pela exigência do destino na determinação do cumprimento das provas humanas, talvez, pela minha – ou nossa –, visão da imortalidade dos criadores da arte.

Gonzaga – de Pai Para Filho guarda na seleção de seu elenco o seu outro grande trunfo. Fica difícil apontar qual, entre Land Viera (Gonzagão na adolescência), Chambinho do Acordeão (adulto), Adélio Lima (na velhice), Cláudio Jaborandy (o pai Junuário), e Júlio Andrade (Gonzaguinha adulto), aquele que melhor “encarna” o seu personagem, embora Andrade seja um replicante de Gonzaguinha. Nanda Costa (Odaléia), Cyria Coentro (Santana), Sylvia Buarque (Dina) e Cecília Dassi (Nazinha), estão, igualmente, excepcionais.

Louve-se, pelo conjunto da obra, a comunicabilidade de Gonzaga – de Pai Para filho. É essa magia que transforma a criação de Breno Silveira, ao lado excelente À Beira do Caminho, em um dos melhores filmes nacionais do ano. Para ver e rever.

GONZAGA – DE PAI PARA FILHO (Brasil, 2012), de Breno Silveira, com Nivaldo expedito de Carvalho (Chambinho do Acordeon), Júlio Andrade, Cláudio Jaborandy, Nanda Costa, Landa Vieira, Adélio Lima, Giancarlo di Tomazzio, Alison Santos, Sylvia Buarque e Cecília Dassi. 120 minutos. 12 anos.

Veja o trailer de Gonzaga – de Pai Para Filho.

Clique aqui para assistir o vídeo inserido.

 

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